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Tia Lispector e o tal do Nietzsche

Matheus Fernando
Depois de umas 3 semanas sem dar as caras por aqui decidi voltar. Nos últimos tempos a vida tem estado bem corrida com as dinâmicas do final da graduação somadas às exigências de um trabalho recente que me exige muita dedicação já que estou aprendendo todos os seus processos do zero.
Tenho sido aquele clássico escritor vagabundo. Aquele que só tem vontade de pegar um lápis para escrever (um word para digitar - tempos modernos) quando uma ideia muito sedutora me visita a mente. Mas quem de nós não visita ou é visitado por momentos de vagabundices vez por outra?
Eu sinceramente tenho sérias dúvidas quanto àqueles que se mostram produtivos o tempo todo. Santos o tempo todo. Polidos demais ou os clássicos “sabichões da última hora.” Tenho certeza que você deve conhecer algum, enfim …
Hoje, um sábado pela manhã, eu estou aqui tentando escrever e nada me vem. Fiz meu clássico ritual para esses momentos. Ler algumas páginas da tia Clarice Lispector ou do tal do Nietzsche. É incrível como ler alguns parágrafos de quaisquer coisas que um dos 2 tenha escrito me teletransporta para outro lugar. Talvez para o mundo das ideias como diria Platão.
Não sei muito bem o que tem na forma de escrever deles. Reformulo, até que sei um pouco. Por vezes um estilo mais aforístico, menos compromissado com estilo ou com uma certa preocupação para com quem irá ler. Sem a necessidade de se fazerem entendidos. Isso é até legal para quem escreve, já para quem tenta lê-los nem tanto.
Contudo, é algo estranho. Geralmente cada parágrafo, cada frase tem muito conteúdo condensado. Toda vez que tento pegar um livro de ambos para ler, não consigo acabá-lo. Paro em poucas páginas, poucos capítulos. Não é uma leitura que dá para ser feita numa fila, ou num momento qualquer. É uma leitura daquelas que tem se parar com uma xícara de café na mão, uma taça de vinho ou algo do tipo.
Lê-los é sempre uma experiência diferente. De diversas formas é uma leitura que te fere, que te perfura algo por dentro, que te sangra o palato mole. Rompe o nosso olhar utilitário e nos joga numa esfera de tempo que não tem a ver com o Chronos. Mas que também não necessariamente se trata do Kairós. Não é algo que você consegue refletir, aliás nessas horas o intelecto em nada nos ajuda.
Você consegue sentir, entrar num fluxo com eles mas sem compromisso com o destino, onde isso vai dar. O tempo neste lugar passa diferente. Acho que se trata do mesmo tempo, do mesmo fluxo que assolava o físico Stephen Hawking. Considerado um dos maiores cientistas que já esteve entre nós, morreu em 2018. Esse era mais um dentre nós, mas que não habitava só por aqui, assim como a tia Lispector e o tal do Nietzsche.
Hawking foi o físico que uniu a teoria geral da relatividade com a mecânica quântica. Ele foi o defensor e criador da ideia da existência de vários mundos, a teoria do buraco negro, essas coisas assim. E que foi confirmada essa semana, como pode? Tenho muita vontade de ler o seu livro Uma Breve História do Tempo mas confesso que tenho medo de ficar preso nesse mundo paralelo que assolava pessoas como Tia Lispector, o tal do Nietzsche, Hawking e tantos outros.
Se já ler alguns poucos parágrafos desse povo já me desestabiliza dum tanto que eu tenho que pegar uma folha correndo para começar a escrever na medida em que esse mesmo fluxo se apresenta para mim, imagina estudar, se dedicar às obras do Hawking? É realmente perigoso, não sei se vale a pena.
E não, não se trata de psicografia ou algo do tipo antes que alguns de vocês intuam assim. Até muito pelo contrário, já que na psicografia se trata de escrever mensagens ditadas por Espíritos de outro plano. Se lembra quando no início desse nosso papo eu disse que esse fluxo não se trata nem de outro mundo? Outro tempo? Outro plano? Assim como não se trata também somente desse que vivemos, utilitário, explicativo, racional… É uma espécie de entre, mas que também não consigo explicar muito bem ainda.
Vou escrever o meu Trabalho de Conclusão de Curso sobre isso! Vou usar tia Lispector o tal do Nietzsche e outro povo doido desse para falar da escrita como acesso a esse lugar, a essa experiência. Prometo que paro por aqui para falar mais sobre isso quando também estiver mais claro para mim.
Vish, falando em Tcc, acabou que eu puxei a matéria, já estamos quase na metade do semestre e eu nem dei sinal de vida para o meu orientador, fora o tanto de textos que eu já era para ter lido… Estão vendo por que às vezes eu sumo sem nem deixar sinal de fumaça? Como que tem tempo pra fazer isso tudo? Orem por mim, caros amigos leitores. No final vai dar tudo certo, ou algo próximo disso. Até semana que vem, se eu sobreviver a essa …
Matheus Fernando é aluno de graduação em Psicologia na Universidade Federal Fluminense. É escritor que transita entre gêneros literários como poesia, crônica, conto, peça, ensaio e artigo.