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Ser escritor
Atualizado: 1 de ago. de 2021

Flávia Joss
No dia 25 de julho comemora-se o dia Nacional do Escritor e com essa data surge uma reflexão: O que devemos comemorar? Talvez você esteja pensando que eu estou de mal humor, que ando aborrecida, mas te adianto que não é nada disso.
Durante a pandemia houve uma explosão de escritores nas redes sociais. Eu mesma passei a utilizar o Instagram como um meio de divulgar minhas crônicas e poesias. Contudo nesse emaranhado, muitos dizem ser o que não são. Há muita autoajuda travestida de poesia e literatura. Mas também há muitas pessoas se descobrindo, verdadeiramente, enquanto escritores. Quando comecei a transformar meu IG pessoal em literário passei por vários momentos de ansiedade, eu gastava um bom tempo escrevendo/gravando um poema e quando postava não surtia o efeito que eu esperava, ao passo que via textos tão rasos terem milhões de curtidas e compartilhamentos. Era extremamente frustrante... Aos poucos fui entendo como as coisas funcionam e me entendendo enquanto escritora. Não é o número de curtidas, comentários e compartilhamentos que mensuram minha capacidade literária. É claro que é muito bom ter o feedback do leitor, portanto mais um questionamento surge: Quem é esse leitor que está nas redes? Quais são suas referências? Teria ele um hábito de leitura construído previamente? São as perguntas que nos movem...
Ser escritor no Brasil é uma tarefa árdua. A maioria não vive da literatura que produz, divide seu tempo entre a arte literária e o “ganha pão”. Pagamos caro para ter nosso livro publicado e as editoras não dão o suporte necessário. Para a realidade do nosso país, o livro tem um preço elevado. Eu poderia gastar linhas e mais linhas para falar de tudo que envolve ser um escritor em terras brasileiras, porém ainda resistimos. Tenho vários amigos escritores que estão levando o sonho adiante, publicando poesia, romance, contos... pessoas anônimas e cheias de talento buscando um lugar nesse disputadíssimo espaço. Para esses, o Prêmio Jabuti (o qual se paga uma fortuna ´para participar) ainda está muito longe, entretanto seguimos compartilhando nossa arte.
Existe uma canção que traduz bem o sentimento que me impulsionou a escrever o texto de hoje, Pena, gravada pela banda O Teatro Mágico, com ela finalizo essa crônica torcendo para que seja centelha de muitas outras reflexões.
Pena
O poeta pena
Quando cai o pano
E o pano cai
Um sorriso por ingresso
Falta assunto, falta acesso
Talento traduzido em cédula
E a cédula tronco é a cédula mãe solteira
O poeta pena
Quando cai o pano
E o pano cai
Acordes em oferta
Cordel em promoção
A prosa presa em papel de bala
Música rara
Em liquidação
[...]
O palhaço pena
Quando cai o pano
E o pano cai
A porcentagem e o verso
Rifa, a tarifa e refrão
Talento provado em papel moeda
Poesia metamorfoseada em cifrão
O palhaço pena
Quando cai o pano
E o pano cai
Meu museu em obras
Obras em leilão
Atalhos, retalhos, sobras
A matemática da arte em papel de pão.
[...]
Julho, 2021.
Flávia Joss (@flaviasjoss_) é escritora, professora de Língua Portuguesa e Literatura, especialista em Gêneros textuais e Interação. Possui cursos de aperfeiçoamento nas áreas de Arte& Espiritualidade, Escrita Criativa