Jornal Poiésis
Origem do conceito de Justiça Ambiental

Francisco Pontes de Miranda Ferreira*
As questões ambientais vêm sendo tocadas predominantemente em movimentos de classe média em que o assunto de justiça social não tem sido prioritário. No entanto, estamos assistindo uma transformação importante em que movimentos mais populares estão englobando as questões ambientais. Esta junção ocorreu nos bairros operárias dos Estados Unidos, a partir dos anos 1980, que lutavam contra depósitos de lixo tóxico nas proximidades de suas comunidades. Grupos ativistas afrodescendentes e de latinos reivindicavam democracia na distribuição dos riscos ambientais e criticaram os movimentos ambientais de classe média que não focavam a questão de injustiça ambiental. Exigiam mudanças nas Leis Federais. Ao mesmo tempo, em vários locais do mundo erguiam movimentos sociais diretamente relacionados às questões ambientais como água, florestas e manguezais. Este tipo de ambientalismo de raiz inclui nos debates ambientais questões como gênero, raça, habitação, saúde, direitos civis e saneamento. Assuntos raramente tratados pelos movimentos ambientais de classe média. Trata-se também de uma resposta à afirmação que muitos ambientalistas da elite assumem, ao dizerem que os problemas ambientais não interessam aos pobres. Pelo contrário, a pobreza, a contaminação, a proliferação de doenças e a falta de trabalho digno foram os motores do ambientalismo popular. Problemas historicamente construídos pela expansão capitalista (BULLARD, 2003).
A debilidade alimentar e a falta de serviços de saneamento aumentam as possibilidades de doenças. Mesmo as contaminações que supostamente atingem todos, como a poluição do ar, vão afetar muito mais os debilitados de saúde. A imunidade baixa em conjunto com o contato mais próximo com lixo, esgoto a céu aberto e produtos tóxicos torna os mais pobres muito mais vulneráveis. As empresas disfarçam e justificam suas contaminações com o discurso de que estão promovendo emprego e crescimento econômico. Outra grande diferença que precisamos destacar entre os movimentos de raiz e as ONGs ambientalistas de elite e classe média é a própria estrutura. As ONGs funcionam como empresas, com funcionários qualificados, equipamentos e verbas, muitas vezes altas, enquanto que os movimentos de raiz são como qualquer outro movimento operário popular que contam com militantes voluntários e não possuem recursos. Quando uma indústria contamina recursos naturais e contamina gente para ganhar lucros, estamos falando de luta de classes. O ambientalismo popular ainda tem o fato de estar muito mais próxima da realidade da contaminação em locais em que as desigualdades sociais também são marcantes. Não temos como separar justiça ambiental da social e da luta de classes e assim o território se transforma num campo de batalha político.
Referência
BULLARD, R. People of color Environmentalism. Cambridge: MIT Press, 2003
*Francisco Pontes de Miranda Ferreira é Jornalista (PUC Rio) e Geógrafo (UFRJ) com mestrado em Sociologia e Antropologia (UFRJ), pós graduação em História da Arte (PUC Rio), Doutorando no Programa de Pós-Graduação em Meio Ambiente da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, membro do conselho editorial do Jornal Poiésis. É diretor da Arcalama Serviços de Comunicação (www.arcalama.com.br)