Jornal Poiésis
Observação do mundo – primeiras percepções

Francisco Pontes de Miranda Ferreira
Antes de ir viver em Londres, até os cinco anos de idade, morávamos em Copacabana e todos as sextas feiras, no final da tarde, íamos para um sítio em Teresópolis. Naquela época o bairro do Salaco era totalmente rural com pouquíssimas casas que pertenciam a sítios grandes. Chegávamos tarde à noite no sítio, depois de jantarmos no Centro de Teresópolis e todo mundo ia dormir, cansados.
Sábado era sempre o primeiro a acordar e saía da casinha sem acordar ninguém. Gostava de ir para a parte mais alta do terreno para ver o sol nascer. Nesta parte mais alta tinha ao Leste, onde o sol nasce, as montanhas da Mulher de Pedra, ao Norte o belíssimo vale do córrego do Príncipe, no Oeste a Pedra da Tartaruga e ao Sul a Serra dos Órgãos com a Pedra do Sino e o Dedo de Deus. Ficava girando para observar todos estes encantos da natureza e a trajetória do sol. Adorava as árvores grandes na direção do vale. Era o momento mais alegre da semana e me lembro como se fosse ontem, me marcou para o resto da vida. Depois aquela vida ao ar livre, brincando no jardim e na floresta e à noite as estrelas, deitava no chão, ao ar livre, para admirar o céu.
Mas, adorava também a chuva, especialmente as tempestades de verão no final da tarde, que ficava admirando na varanda até o anoitecer. Domingo repetia tudo de novo e não queria nunca voltar para o Rio no final da tarde e perguntava aos meus pais por que não podemos ficar no sítio? Por que tinham que ir trabalhar? Chegava a me esconder. A semana no Rio não era tão ruim assim; ia à praia, encontrava com os amigos, mas felicidade mesmo, eu já tinha compreendido, é contemplar a natureza bem longe da cidade grande com suas máquinas, serviços e produtos e assim passei grande parte da minha vida viajando, acampando, curtindo o campo...
Como filho único, tive e tenho muitos amigos, mas sempre adorei a solidão e realizei a maior parte de minhas viagens físicas e imaginárias sozinho. Estas percepções, da primeira infância, influenciaram toda a minha vida profissional e acadêmica. Foram naqueles momentos das primeiras observações do mundo que emergiram em mim, outros valores, diferentes daqueles do consumo e da moda capitalistas que nunca me atraíram. Formou-se, também, bem forte, uma rebeldia e uma vontade de transformar.
Francisco Pontes de Miranda Ferreira é Jornalista (PUC Rio) e Geógrafo (UFRJ) com mestrado em Sociologia e Antropologia (UFRJ), pós graduação em História da Arte (PUC Rio), Doutorando no Programa de Pós-Graduação em Meio Ambiente da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, membro do conselho editorial do Jornal Poiésis. É diretor da Arcalama Serviços de Comunicação (www.arcalama.com.br)