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O retorno
Atualizado: 14 de nov. de 2021

Flávia Joss
Como presente em comemoração ao Dia dos Professores, “festejado” no dia 15 de outubro, o govenador do Estado do Rio de Janeiro convocou, na quarta, dia 18/10, os professores que atuam na rede estadual para o retorno no último dia 25/10. “Tudo voltando ao normal e os alunos em casa?”, diriam os simplistas. Sei que uma porta se abre para um grande debate que esta humilde crônica, certamente, não dará conta. Contudo, gostaria de usar esse espaço para expressar um pouco da minha preocupação.
Na segunda, quando cheguei na rua da escola, tive vontade de voltar para casa. A rua estava cheia, todos os alunos aglomerados, sem máscara. Retomada das aulas com 100% do contingente. A maioria dos alunos ainda não tomaram a segunda dose, e os menores de doze anos, não tomaram sequer a primeira. Apesar da higienização do espaço, não há distanciamento, o tamanho das salas não permite. Eles sentam juntos, lado a lado, abaixam as máscaras toda hora, compartilham a garrafa d’água. Nós, professores, diante da sala lotada, com máscara, face shield, e no meu caso, óculos, pareço mais uma soldadora que uma professora. E fico totalmente desconfortável, meu grau é pra perto, preciso colocar e tirar os óculos toda hora. Além disso, o face shield abafa o som da voz, que já está abafado pela máscara. Talvez, no futuro, eu consiga olhar para essa situação e achar alguma graça, entretanto, hoje, só consigo me indignar.
Fui acometida por uma crise de enxaqueca que há meses não tinha. Um mal estar e uma sensação contraditória... É claro que o ensino precisa ser retomado, a disparidade entre os alunos da rede pública e privada tornou-se ainda mais discrepante durante o ensino remoto. Mas essa volta, totalmente sem estrutura, é uma brutalidade. Alguns, mal informados, dirão que gostamos de nos vitimar.... Venha conhecer nossa realidade de perto, passe um dia conosco, depois tirem suas conclusões. Tudo isso sem mencionar os baixos salários, a perda de direitos, enfim...
O dia hoje está pesado. A educação é massacrada a olhos nus. Tento me agarrar aos fiapos de esperança, que por insistência, ainda pulsam lentamente. Cabe a nós, engolir o choro e se sujeitar ao desgoverno que me faz lembrar um personagem do saudoso humorista Chico Anysio, o Justo Veríssimo, cujo jargão dizia “Pobre tem que morrer tudinho.” Parece-me que esse ainda continua sendo o jargão dos nossos governantes... Não sei se a vida imita arte ou se a arte imita a vida.
Flávia Joss (@flaviasjoss_) é escritora, professora de Língua Portuguesa e Literatura, especialista em Gêneros textuais e Interação. Possui cursos de aperfeiçoamento nas áreas de Arte& Espiritualidade, Escrita Criativa