Meu pai não me ama
Atualizado: 13 de set. de 2020
Matheus Fernando*
Muita expectativa para o emblemático dia dos pais, pelo menos por parte do filho. De um filho que clamou durante toda sua infância por atenção e uma dose bem específica de afeto.
- Pai te amo. Diz o filho suplicante. O pai faz silêncio. Um silêncio mórbido somado a uma leve expressão de constrangimento.
Foi difícil e muito incômodo conviver com essa falta durante a adolescência. Com o tempo, falta espaçada. Outros olhares, outras constituições, outras necessidades e inúmeras outras possibilidades de amar e ser amado.
Com o tempo o filho percebeu que também não existe Pai suficientemente bom. Com o tempo ele lembrou que seu Pai foi filho de Pai português. Na medida do tempo ele lembrou que seu Pai viveu toda sua infância dentro de uma das comunidades carentes mais perigosas do Rio de Janeiro. No decorrer dos anos ele colheu informações e descobriu que seu Pai foi “obrigado” a trabalhar desde os 9 anos de idade para ajudar nas despesas de casa para com os seus outros 7 irmãos.
Ainda esse ano, chegou a seu conhecimento que seu Pai, perdeu o Pai dele para o tráfico quando ele tinha apenas 10 anos de idade. E no meio de tantas outras descobertas teve discernimento para entender que seu Pai também tinha uma história. História essa que por sinal ele, como filho pidão e carente de afeto, nunca se interessou a tentar entender.
Esses e outros tantos enigmas da história de seu Pai o trouxeram aqui. Ele no dia dos pais conseguiu um afetuoso “Pai, te amo!” de seu filho. De um filho que tinha o mínimo de estrutura para pelo menos dizer. Seu filho, continuou com sua boa e velha falta. Seu pai não conseguia se expressar, não tinha muito repertório. Expressava amor de outras formas.
Um filho carente e sua falta. Um pai carente, refém de sua história com incontáveis faltas. Mas que nem verbalizar conseguia, e mais um dia dos pais.
Matheus Fernando é aluno de graduação em Psicologia na Universidade Federal Fluminense. É escritor que transita entre gêneros literários como poesia, crônica, conto, peça, ensaio e artigo. matheusfernando.contato@gmail.com