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  • Foto do escritorJornal Poiésis

Mercadores de natureza


Francisco Pontes de Miranda Ferreira


Em 2009, uma rede de articulação de movimentos sociais, povos tradicionais, sindicatos, ONGs e pesquisadores criou o chamado “Grupo Carta de Belém” com o objetivo de enfrentarem a crise ambiental e climática de forma crítica e de combate às chamadas “falsas soluções de mercado” e aos denominados “processos de financeirização da natureza apontados pela Economia Verde”. Foi uma resposta direta ao seminário realizado em Belém para implantação da proposta internacional conhecida como REDD (Redução de Emissões por Desmatamento e Degradação). O grupo rejeita a política de mercado de carbono. De acordo com o manifesto, os mecanismos de mercado como instrumentos para reduzir as emissões de carbono não são capazes de assumir responsabilidade sobre a vida do planeta. O mercado mundial de CO2 é considerado mais um tipo de investimento do capital financeiro que não rompe com o modelo de produção e consumo atuais. De acordo com o movimento, são os mesmos princípios que atuaram na colonização com a degradação ambiental e das culturas tradicionais que continuam em jogo. A Carta de Belém aponta para a necessidade de um novo modelo de produção, distribuição e consumo, baseado na agroecologia, na economia solidária e numa matriz energética diversificada e descentralizada que garantem a segurança alimentar (Carta de Belém, 2009).

Na Cúpula dos Povos durante a Rio+20 foi elaborado um documento conhecido como “Dossiê do Acre”, também criticando os “mercadores da natureza”. Trata-se de uma crítica a chamada “Economia Verde” que foi o ponto principal da Rio+20. De acordo com o documento, a mercantilização da natureza acaba provocando o aumento da degradação, conflitos territoriais e concentração de renda. Povos tradicionais e a economia pré-mercantilista não provocavam ameaças socioambientais. O projeto de valorização da natureza vai de encontro com as estratégias do Banco Mundial e de outros organismos internacionais. O Dossiê do Acre relata que as chuvas que provocaram enormes danos sociais no Estado em 2012 tiveram o mesmo volume das tempestades do passado, características da região. O problema, portanto, foi a concentração da população de baixa renda nas áreas de risco. Podemos fazer uma comparação com a realidade da Região Serrana do Rio de Janeiro, em que chuvas torrenciais no verão são típicas, mas sempre causam desastres socioambientais, com destaque para a tragédia de janeiro de 2011. O problema é a ocupação das encostas e da beira dos canais fluviais, provocada por desigualdades sociais e territoriais, em que a população mais pobre não tem opções melhores de moradia e em que a especulação imobiliária e a extensão de uma agricultura altamente industrial e comercial provocam desmatamento e ocupação imprópria e desigual do solo. O dossiê ainda afirma que na capital do Acre, Rio Branco, os esgotos continuam sendo lançados nos rios e a coleta de lixo não abrange as periferias da cidade, assim como ocorre na Região Serrana fluminense. Defesa ambiental e injustiça social formam um conjunto só e uma ocupação social do território deve ser a prioridade e não a apropriação para finas da acumulação privada. Precisamos, antes de tudo, de diálogo e participação democrática política e de acesso às informações, assim como uma educação crítica e transformadora.


Referências

Carta de Belém, 2009

Dossiê do Acre, Rio+20, 2012


Francisco Pontes de Miranda Ferreira é Jornalista (PUC Rio) e Geógrafo (UFRJ) com mestrado em Sociologia e Antropologia (UFRJ), pós graduação em História da Arte (PUC Rio), Doutorando no Programa de Pós-Graduação em Meio Ambiente da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, membro do conselho editorial do Jornal Poiésis. É diretor da Arcalama Serviços de Comunicação

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