Jornal Poiésis
Memórias Póstumas de Brás Cubas
Atualizado: 22 de mar. de 2021

Geraldo Chacon
APRESENTAÇÃO
Machado de Assis, com seu romance, Memórias Póstumas de Brás Cubas, representa uma incrível e indiscutível revolução estética no século XIX, com grandes e diversos reflexos em muitos escritores do século XX.
Podemos dizer, sem medo de erro, que Machado já era, no século XIX, um escritor do século XX. Suas inovações, tanto na postura, quanto no estilo; tanto no assunto, quanto na espacialização do texto, foram inusitadas para sua época.
Podemos dizer que Memórias Póstumas de Brás Cubas, como livro revolucionário, começa antes mesmo do primeiro capítulo, pois sua dedicatória foge a tudo que se fez até então. Em vez de dedicar sua obra à mulher amada, aos pais ou a algum mestre querido, como todos faziam, vejam a quem o narrador Cubas dedica seu trabalho: “ao verme que primeiro roeu as frias carnes do meu cadáver dedico como saudosa lembrança estas memórias póstumas”. Também o prólogo “Ao leitor” pode ser considerado parte integrante da obra, pois nele o pseudoautor já prepara o leitor para uma obra de traços estéticos bem diferentes do que vinham fazendo até então os escritores românticos, incluindo o próprio Machado de Assis em sua primeira fase.
ENREDO
Brás Cubas foi um garoto peralta que judiava dos escravos e fazia travessuras como a de amarrar as perucas das visitas, que, caíam quando elas se levantavam. Ainda na adolescência, envolveu-se com Marcela, que, segundo ele, amou-o por onze meses e quinze contos de réis, ou seja, era uma prostituta. O pai, como corretivo, mandou-o para a Europa, para estudar.
Ao voltar, Brás fica inativo e nem consegue o que tenta fazer como ingressar na política, casar-se com Virgília, como tanto desejava seu pai. Virgília, vendo que Brás não prometia futuro, casou-se com Lobo Neves, que logo distinguiu-se na política, sendo designado para interventor em São Paulo.
Quando o casal volta ao Rio de Janeiro, Virgília atraiu a atenção de Brás Cubas, que se tornou seu amante. Nessa época, Cubas reencontra um seu amigo de infância, Quincas Borba, vivendo em estado de mendicância. Após esse encontro, Quincas desaparece e, tempos depois, quando volta, está empolgado com uma invenção sua; um sistema filosófico denominado “Humanitismo”, revelando sinais de demência.
Virgília e Cubas, ao envelhecerem, abandonam os encontros secretos, tornando-se apenas amigos. Um dia, enquanto procurava inventar um emplastro miraculoso que curasse a hipocondria dos homens, Brás Cubas deixou de cuidar da própria saúde, morrendo de uma pneumonia.
O falecido Zhé Gomes (Quincas) e Geraldo Chacon (Cubas) em cena da peça, montada pelo Grupo RIA, que ficou anos em cartaz no Teatro Lucas Pardo Filho em São Paulo..
ESTILO DE ÉPOCA E ESTILO INDIVIDUAL
A estética realista surge como uma oposição ao Romantismo. Evitando as personagens extraordinárias, heroicas, o escritor realista opta por personagens comuns, portadores de defeitos ou imperfeições. O próprio narrador Brás Cubas revela seus pensamentos e desejos mais mesquinhos e sórdidos.
Ao contrário dos românticos, que valorizam o passado histórico, os realistas procuram firmar-se no "aqui e agora", abordando sempre assuntos contemporâneos. É o que faz Machado em suas obras.
Um tema constante nas obras realistas é a infidelidade, opondo-se também aos românticos que valorizam o amor fiel. Encontramos a infidelidade em Madame Bovary, de Flaubert, em O Primo Basílio, de Eça de Queirós e em Memórias Póstumas de Brás Cubas e em Dom Casmurro.
A ação das narrativas românticas é dinâmica, valorizando o aspecto externo, as peripécias, enquanto nas obras realistas ocorre um volver-se para o interior, para o psicológico.
Outra oposição ao estilo romântico é a atitude realista de evitar a fantasia e a imaginação em que se compraziam os escritores da primeira metade do século XIX. O escritor realista busca mergulhar na realidade objetiva que os circunda, fazendo da ficção um espelho capaz de revelar e denunciar os problemas de uma sociedade burguesa e competitiva.
Machado de Assis é um escritor realista, mas muito peculiar, pois adota os pressupostos básicos da estética, mas, sem se escravizar a eles, avança livremente em busca de outras possibilidades.
PROBLEMÁTICA E PRINCIPAIS TEMAS
Um dos temas favoritos de Machado é o de que na infância já se organiza toda a personalidade do adulto, como afirma neste romance: “o menino é o pai do homem”.
Temos também, além do adultério, a temática do “ser e do não ser, a insidiosa presença da morte que acaba dominando a atenção, como verdadeiro tema”. A interpretação da vida como um espetáculo teatral é outro tema deste como de outros romances de Machado: “...meu cérebro foi um tablado em que se deram peças de todo gênero, o drama sacro, o austero, o piegas, a comédia louçã, a desgrenhada farsa, os autos, as bufonerias...”.
A dissimulação, como necessidade social, está sempre presente e é coerente com a visão da vida como representação teatral. Outra recorrência é a passagem inevitável do tempo. Outro tema da maior importância a unificar todos os demais é o de que o interesse pessoal está acima de tudo: “Quem não sabe que ao pé de cada bandeira grande, pública, ostensiva, há muitas vezes várias outras bandeiras modestamente particulares, que se hasteiam e flutuam à sombra daquela, e não poucas vezes lhe sobrevivem?”
BIBLIOGRAFIA CONSULTADA
Assis, Machado de - Memórias póstumas de Brás Cubas, SP, 1978, Editora Ática.
Assis, Machado de - Memórias póstumas de Brás Cubas, RJ, 1988, Livraria Garnier.
Bosi, Alfredo e outros - Machado de Assis, SP, 1982, Ática.
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O romance condensado, capítulo por capítulo, pode ser adquirido impresso na www.agbook.com.br ou em formato PDF www.literarte.online.