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  • Foto do escritorJornal Poiésis

JORGE MAUTNER: O TRAPÉZIO ANTES DO SALTO



Encontro-me com Jorge Mautner que, tendo acabado de ler sobre mais uma dessas assombrosas descobertas científicas, me diz maravilhado: “Braz, somos a última geração dos mortais!”.


A princípio não dou muita importância à observação do poeta mas sua frase fica em minha cabeça, pulando de um lado a outro, como naquele personagem de Machado de Assis


Tento fugir dela: Tomo um cafezinho, como um sonho de padaria, olho as mulheres nuas na banca de revistas, as mulheres vestidas caminhando nas ruas, ouço os sons dos carros e dos pardais, como se fossem uma sinfonia concreta, e sigo em frente.


“Sou um homem livre, não me importo com a morte”, penso enquanto caminho em direção à minha casa.


Engano. Mal entro na sala e a frase do Mautner volta com toda sua sonoridade inquietante: “Somos a última geração dos mortais!” Mas o que aconteceria, se fôssemos imortais?, me pergunto.


Creio que a princípio sentiríamos alegria por saber que veríamos, para sempre, todas as transformações pelas quais passará o mundo. Mas e nós, como nos transformaremos?


Sou de uma geração que conheceu a carta, o telefone, o celular, a internet. Ouvimos a marchinha, o samba, o jazz, o rock, a bossa-nova, o rap, o funk. Passamos por diversos regimes políticos, vimos o homem chegar à lua, vimos o circo, o teatro, o cinema, a TV. Vimos o vídeo, o DVD, etc., etc., mas em nenhum momento vimos a humanidade plena, onde a mais bonita das frases cristãs – amai-vos uns aos outros - se concretizasse.


Por que? Porque o homem, “este bicho da terra, tão pequeno”, ainda não encontrou-se. Não soube aceitar a vida e a morte como elas são, afastou-se da essência e deixou-se dominar pela ganância. Dá mais valor a uma moeda de lata do que a um livro e ao cantar de um riacho, de um rio... O homem distanciou-se de seu centro, foi tomado pelo medo e se tornou incapaz de se maravilhar – como o Mautner se maravilhou, sabendo que outros viverão mais que ele, mais que nós, que a vida se expande.


As “civilizações” foram criadas sobre cadáveres, a morte tornou-se um negócio rendoso. Matamos pelo petróleo, matamos por uma fronteira, matamos para vender armas da morte.


Mas alguns, como Jorge Mautner, são capazes de transformar a massa em pão, o vinho em canção e, generosamente, distribuí-los, como distribuem a poesia e a vida. São capazes de ver o mundo como um imenso milagre e, enquanto atravessam a fronteira e alcançam a geração dos imortais, espalham a beleza de uma valsa, de um samba, de uma moda caipira, de um maracatu atômico.


Braz Chediak é escritor, mora em Três Corações MG

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