top of page
Buscar
  • jornalpoiesis

Estraguei a pomba do café




Matheus Fernando


Eu tento seguir à risca aquela premissa dos antigos, aquela velha guarda que dizia aos mais jovens para “tomarem café como um rei, almoçar como um príncipe e jantar como um mendigo.” Eles falavam isso no sentido da quantidade e ou qualidade nutritiva da refeição seguirem mais ou menos essa ordem, por turnos. E já faz uns anos que eu tento seguir essa mandinga.

Levar isso em consideração me ajudou inclusive a resolver um problema de saúde seríssimo que tenho desde a tenra infância: fome. Acordo pela manhã – como diria alguns colegas de rua na infância – querendo comer até reboco de parede, se possível. Então nos últimos anos, depois de testar muita coisa diferente como café da manhã, várias receitas... eu consegui chegar num ponto que julgo ter solucionado o problema, pelo menos até um determinado horário. 150 gramas de frango desfiado (temperado, claro) batidos num tapaué com 4 ovos e depois fritos numa frigideira antiaderente e um fiapo de requeijão. Desde então a paz reina, pelo menos mais de uma hora.

Hoje não deu muito certo. Coloquei o frango no vasilhame e ao quebrar o primeiro ovo sobre o frango... adivinha? Sim, o ovo estava podre! E era a última porção de frango que havia nesta casa. A agonia misturada a uma vontade fulminante de xingar alguém era tangível no ambiente. Pior que nessa hora me veio à mente as palavras de minha mãe quando ela dizia que “antes de quebrar os ovos na frigideira, se quebra eles num copo para caso estejam podres você não perca o guisado.” Me surpreende o quão burro caboclo pode ser.

O mais angustiante é que isso significava que eu passaria a manhã toda com aquela fome perene sinalizando minha incompetência. O que eu comeria agora? Pão é farinha, trinta minutos depois a fome cantaria em dó maior no pé do meu ouvido. Fruta é complemento, não serve para matar a fome. A vida do ectomorfo é realmente difícil!

Decidi comer 2 pães de forma com 4 ovos. Tristeza e desânimo trazendo o tom que ditaria o dia, queda de potência. Passei o café e mais uma surpresa. Geralmente eu passo pouco café porque moro sozinho, o equivalente a uma xícara cheia para terminar de acordar. Café passado e ao terminar de encher a xícara, fumacinha subindo trazendo o aroma para suavizar um dia difícil e quando volto a para a xícara ... adivinha? Sim, eu coloquei o café na exata xícara que usei para testar a validade dos ovos que a essa altura do campeonato já estavam fritos sobre os pães.


Estou enfrentando o dia mais angustiante de todo o ano. E olha que estamos na segunda semana do ano. Que vontade de reiniciar o dia de hoje. Como eu queria ter um controle para voltar pelo menos uma hora atrás estilo aquele filme “Click” com o ator Adam Sandler. Percevejo que o dia de hoje promete. Só um banho gelado para esfriar a cabeça – e olha que não são nem seis horas da manhã…


Matheus Fernando é Psicólogo e escritor que transita entre os gêneros literários como poesia, crônica, peça, ensaio e artigos.

matheusfernando.contato@gmail.com


Foto: Ben Kolde

23 visualizações0 comentário

Posts recentes

Ver tudo
bottom of page