Jornal Poiésis
Espero ansiosamente por você, Poema Sujo (Crônica)
Atualizado: 8 de jun. de 2020

Matheus Fernando*
Impreterível verdade é o título de um poema que eu sempre quis escrever! Sempre não, reformulo... para ser mais preciso desde o dia em que estava numa van voltando para casa, para casa de meus pais. E nesse trajeto me vieram vários versos, vários questionamentos, vários estranhamentos e em todos eles o tema verdade era central.
Já estava decidido: “Impreterível verdade!” Exatamente assim, e, com um ponto de exclamação logo no final da frase-título de duas palavras. Nesse trajeto me vieram vários apontamentos, rimas, e meio milhão de perspectivas. Primeiramente em torno da palavra ‘impreterível’. Como foi possível eu ter tanta firmeza e afinco para escrever naquele momento sobre e com uma palavra que eu sequer sabia o significado?
Num segundo momento recordo-me que minha angústia pairava em torno da tão terrível verdade. O momento era tão cabuloso e tão áspero que eu não conseguia completar um raciocínio sem perspectivá-lo. E assim eu fui, questionando e versando. Questionando e versando sobre algo que eu não sabia o significado e sobre algo que eu não tinha a menor certeza. A verdade escorria por entre os meus dedos a cada curva que a van fazia.
Sabe aqueles poemas que já nascem prontos? Pois é, só tem um detalhe. Eu não tinha papel nem caneta naquele dia comigo e meu celular já estava descarregado. A viagem era longa, mas também não estava a fim de incomodar ninguém pedindo uma caneta emprestada naquele dia. Ao chegar em casa tentei de todo jeito vomitar todos aqueles questionamentos e versos num papel. Todavia, eles já tinham ido embora. Embora de mim. Me habitaram durante toda a viagem e quando enfim fui dar parte, fui dar queixa daqueles versos miseráveis num papel, os fialhos fugiram de mim. Devem ter corrido quando abri a porta daquela van e desci na Trindade - bairro que meus pais moram em São Gonçalo. Eu tinha certeza que deles sairiam uma espécie de Poema Sujo, como proposto por Ferreira Gullar. Meu poema sujo, minhas discordâncias e incoerências perspectivadas.
Desde esse dia já se passaram 3 anos e vez por outra, em lugares estranhos por onde passo, de sentimentos moribundos que me visitam e de perfumes adocicados daqueles ruins de verdade que passam perto de mim, de dias suspeitos assim espero os tais versos à espreita. Tenho dúvidas a tirar com eles. Tenho resquícios de questionamentos que vez por outra me visitam a mente e quando estaciono para olhá-los, os mesmos desaparecem como poeira ao vento.
Ando atento por onde passo. Ando em espírito de verseiro a cada van que pego, mas até hoje, nada! Não tem problema, aguardo sem pressa. Aguardo ansiosamente sem pressa alguma. Espero atento por onde ando o dia em que os fialhos aparecerão, e dessa vez estarei com uma caneta na mão.
Matheus Fernando é aluno de graduação em Psicologia na Universidade Federal Fluminense. É escritor que transita entre gêneros literários como poesia, crônica, conto, ensaio e peça.
matheusfernando.contato@gmail.com