Esperança e navegação
Atualizado: 8 de fev. de 2021
Flávia Joss*
Finda-se 2020... Enquanto alguns o excomungam e esperam por um alento em 2021, eu procuro a poesia. Decerto fomos assolados... tantas famílias vestiram-se de mortalhas, crianças brincam sem perspectivas, as escolas estão fechadas, a vida está confinada, os governantes tripudiam da nação..., mas meus olhos rastreiam os caquinhos de esperança derramados pelas vias na contramão.
De dentro do meu quarto, enfurnada em minhas reminiscências nasceu um livro. Pela janela aberta contemplava a BR e as poucas árvores que colorem o bairro. Ali, do meu mundo,ouvia o latido dos cachorros, o miar dos gatos,o canto dos pássaros, oassovio desavisado do moço de bicicleta, o som da buzina e da “makita”, tudo anunciando que a vida segue à revelia de todas as coisas.E se ela segue, o melhor é viver. Sorver cada gota de eternidade que cai sobre nós todos os dias. Deliciar-me com as pequenas alegrias. Saborear as oportunidades. Aprender que todo dia é um recomeço e que uma página em branco surge apenas para ser escrita.
Cultivar a beleza e a esperança não é alienação, é um exercício que estimula os músculos da imaginação, da empatia e da resistência e do olhar. Como nos lembra o poeta angolano Ondjaki “a beleza às vezes é um lugar onde o olhar já sabe aquilo que não quer esquecer...”
Singramos pelos mares deste ano- oceano... aprendi, chorei, me levantei, lutei, tive vontade de desistir, fiquei entediada... Contudo, estou aqui! Se os mares que se abrirão no próximo ano são desconhecidos, me resta seguir o conselho do poeta, navegar é preciso.
Flávia Joss é Professora de Língua Portuguesa e Literatura, especialista em Gêneros textuais e Interação. Possui cursos de aperfeiçoamento nas áreas de Arte& Espiritualidade, Escrita Criativa e Poesia Falada.