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ARARUAMANDO EM TRÊS ATOS

Glauber Mizumoto
(Foto: Camilo Mota)
1
Para que a manhã nasça
é necessário
que se talhe a goela da madrugada
com um corte preciso
da ponta de um bico
afiado
do quero-quero que canta e
grita
às 4.
Jorra o sangue
(coalha-se o alvorecer)
a lagoa semi-parada traduz
o cinza
o azul
do dia
sob o olhar das garças
que consagra os barcos
ao retorno da última pesca,
inaugurando o sol
(ainda tímido)
na felicidade revelada
dos olhos esbugalhados
de uma carapeba
morta
sobre os braços
do primeiro freguês.
Este há pouco
cintilara seus passos
junto a outro
a outro
já marcando ponto
ali na orla da pontinha
enquanto,
dependendo do dia,
de quantos nós,
e dos moinhos escondidos
lá em Praia Seca:
kites,
velas
e stand-ups
se estendem
pela cidade do vento...
Para aqueles que olham,
além das garças,
Araruama é esta orla
(e olhe lá!).
A não ser
a falta que sinto de
Carijojó
Sobara
Aurora
Saudade
entre outros adentros
do município afora
que desconheço.
2
Pra lá do meio-dia,
gosto do sabor que se sente
do vento a balouçar a tarde
com os guizos graves
das casuarinas
(se ainda existem)
ressentindo outros tempos.
(Ah! Nada melhor que isso!)
3
Noite adentra,
pretume denso do mistério maior
sobre o nada.
Alguns já estão dormindo às 8,
outros preferem sair às 11.
Entre este
aquele
ou
o primeiro momento
prefiro os ventos que sopram as respostas
ao leste do norte:
amanhã vai dar praia,
amanhã eu velejo,
amanhã eu caminho,
depois me aposento.
Glauber Mizumoto atualmente reside em Nova Friburgo, mas já foi morador de Araruama. Professor. Doutorando em Literatura Brasileira (UERJ) com pesquisa focada em poesia contemporânea. Autor do livro “Intrusos entre intrusos, eutro: Arnaldo Antunes” (Editora Appris). Compõe textos, canções, kiirtans, entre outras coisas possíveis.