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Abordagem dos conflitos ambientais
Atualizado: 26 de set. de 2022

Francisco Pontes de Miranda Ferreira
Nas ciências ambientais um dos pontos chaves é a problemática das relações sociedade/natureza em que ressaltamos aspectos sociais, ecológicos e civilizatórios. Nesse contexto nos cabe fortalecer os estudos da ecologia política, especialmente com o foco nas características próprias da realidade da América Latina. Estaremos assim colaborando para um campo emergente nas ciências sociais que ainda passa por uma ausência de material acadêmico. O próprio dualismo sociedade/natureza, radicalmente acelerado pelo fenômeno moderno, ainda não está totalmente compreendido e exige maior quantidade de material acadêmico. Os conflitos ambientais em especial, merecem ainda mais trabalhos científicos, principalmente diante da atual crise ambiental que vivenciamos (GAVIRATI, 2019).
A lógica do mercado e do capital promove o desaparecimento de ecossistemas, etnias e tradições culturais e necessariamente, estamos falando de conflitos, onde os grandes empreendimentos batem de frente com as populações que já estão estabelecidas no território, com uma história construída e um estilo de vida. Diminuir a degradação ambiental significa abraçar os movimentos sociais (LEROY, 2011). A questão ambiental é uma nova fonte legítima para tratarmos os conflitos sociais.
Os conflitos ambientais são um objeto científico difícil e complexo. Não se reduz apenas às formas de adaptação das pessoas ao meio. Existem conteúdos políticos relevantes que envolvem as formas sociais presentes no território. São tensões do processo de reprodução presentes nos modelos de desenvolvimento e suas contradições. Atuando em todos os espaços geográficos – de povos tradicionais ou urbanos. As questões ambientais são altamente complexas e um campo de manifestação de conflitos. Com uma configuração de relações e posições na estrutura de distribuição do poder. Campos historicamente construídos e sujeitos a mudanças. Os processos históricos definem as estruturas objetivas e subjetivas e posições no espaço social. Formando-se um estruturalismo construtivista (ACSELRAD, 2004). As lutas simbólicas envolvem a valorização e a desvalorização de tipos de capital. As lutas por recursos ambientais são simultaneamente lutas por sentidos culturais. Provocando desigualdades sociopolíticas. Temos, portanto, que estudar os espaços simbólicos onde desenvolvem-se os conflitos ambientais. O sistema procura regular os conflitos e legitimar acordos, mas nem sempre com sucesso. Geralmente gerando novos conflitos. Todo conflito ambiental tem assim um tipo de capital em jogo formando-se uma distribuição de poder sobre os territórios e seus recursos. A própria definição de sustentabilidade se torna um conflito entre esferas de poder. As empresas trabalham assim o que chamam de sustentabilidade com o que definem como modernização da gestão ecológica e eficiência técnica. Mas, o que predomina e se reproduz são as desigualdades ambientais onde os grupos de baixa renda ficam com os maiores custos ambientais e com menor direito à voz.
No interior do espaço social, os agentes sociais distribuem-se segundo princípios de diferenciação que constituem os campos de forças relativas – espaços de conflito pela posse de espécies de poder/capital específicos que os caracterizam (ACSELRAD, 2004:19).
Estado e discursos científicos muitas vezes procuram despolitizar as questões socioambientais. O Estado geralmente integra-se aos interesses do capital e prepara territórios para isso e os discursos científicos muitas vezes legitimam práticas despolitizando a questão. A própria distribuição de capital social e material é extremamente desigual. Configura-se então a capacidade diferencial de poder sobre o acesso aos recursos como terra fértil, fontes de água e vantagens locacionais em geral. Existe também a diferença sobre os marcos regulatórios e os recursos econômicos. Os conflitos ambientais se manifestam na apropriação material e simbólica. São lutas sociais econômicas e políticas pela apropriação de capital. A luta simbólica legitima ou deslegitima a distribuição de poder. Assim acontece a luta pelos recursos hídricos por exemplo: entre os povos ribeirinhos e os projetos de hidroelétricas. Assim acontecem os “empates” dos seringueiros na Amazônia.
Referências
ACSELRAD, H. “As práticas espaciais e o campo dos conflitos ambientais” in Conflitos Ambientais no Brasil, Rio de Janeiro: Relume Dumará, 2004.
GAVIRATI, P. Três modalidades sociológicas del conflito ambiental in RUGGERIO, C. A. e SUÁREZ, F. (Org.) Los Conflitos Ambientales en América Latina II: Áreas Urbanas y Periurbanas. Buenos Aires: Ediciones UNGS, 2019. 280p.
LEROY. J. P. Justiça Ambiental. Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional (FASE), 2011.
Francisco Pontes de Miranda Ferreira é Jornalista (PUC Rio) e Geógrafo (UFRJ) com mestrado em Sociologia e Antropologia (UFRJ), pós graduação em História da Arte (PUC Rio), pós-graduação em Desenvolvimento Territorial da UERJ Doutorando no Programa de Pós-Graduação em Meio Ambiente da Universidade do Estado do Rio de Janeiro, membro do conselho editorial do Jornal Poiésis.